quinta-feira, 23 de abril de 2015

Sessão Nostalgia Desmemorada 4



27 de agosto de 2011

O(S) Signo(S) da Morte??
Entre o martírio e o suicídio 

     Este texto se propõe a uma pequena reflexão a respeito de um comentário feito pelo mestrando Marcelo José Pereira( PPGH-UFPA), na sua exposição relativa a sua pesquisa: “A(O) suicida – comum-de-dois? As representações sobre o masculino e o feminino através das notícias sobre suicídios na imprensa belenense ( 1891 a 1919)”, no III Encontro de Novos Pesquisadores em História já mencionado em postagens anteriores.       
     No geral, parabenizo o mestrando devido ao caráter interessante do seu tema, assim como sua capacidade apurada de análise e oralidade. Contudo, um comentário inquietou meu espírito. Segundo ele, a Igreja Católica estaria em contradição, no momento em que exaltava o martírio e condenava o suicídio. Naquela hora, pego de surpresa com a questão e ainda interessado no desfecho da análise de Marcelo, não consegui estruturar meus pensamentos, de modo a contra-argumentar a afirmação coerentemente, ou seja, fiquei com medo de falar “besteira” e esperei para refletir em casa. 
     Bem... o que caracterizaria um suicida? Basicamente, seria uma pessoa disposta a tirar a própria vida. Mas por que uma pessoa teria tal aspiração? Acredito que, por viver uma situação, na sua ótica, intolerável, vislumbra como única solução se atirar no vazio. Sim, vazio! Um suicida dificilmente possuiria uma convicção interiorizada de uma existência além-túmulo. Mesmo que tivesse alguma, ela seria inconsistente, frágil, assombrada pela dúvida. Afinal, a não-existência seria o remédio para seu tormento psíquico. É contrária aos seus interesses, a possibilidade de permanecer vivo, após o fim do organismo material, pois a continuação da vida implica na continuidade de seus tormentos, uma vez que as doutrinas religiosas, de um modo geral, não oferecem boas perspectivas ao pós-vida dos suicidas. 
     Um segmento da realidade se tornara monstruoso, uma espécie de problema crônico, insolúvel e que torna cada minuto da vida amargo demais para suportar. Assim, o suicida encontra na morte a solução definitiva. Na verdade, ele não deseja a morte. Apenas procura desesperadamente um fim para seu(s) problema(s), decidindo pelo fim da própria vida, na sua concepção de finitude do existir. 
     O mártir representa um sujeito situado no extremo oposto da mentalidade suicida. Em momento algum ele deseja dar cabo de si mesmo, até porque, na concepção católica que por ora tratamos, não existe essa possibilidade de deixar de existir. O espírito é a fonte da vitalidade, a qual abandona o corpo no pós-morte sem jamais deixar o elemento espiritual, mesmo que seja para segui-lo nos suplícios infernais. 
     O mártir, ao contrário do suicida, não se acovarda diante de uma realidade conflituosa. Ele a enfrenta com uma coragem invejável até suas últimas consequências. Ele a encara, face a face, sem receio da morte porque, na sua perspectiva, esta não existe. Sendo assim, o mártir é amante da vida no seu sentido mais pleno, pois sua convicção espiritual se baseia, justamente, na ideia de eternidade, conceito ausente do vocabulário suicida. Outra questão é o fato de o mártir ser morto por outrem. Marcelo queria aproximar o mártir do suicida, afirmando que o primeiro se entregava à morte, praticando um suicídio indireto. Hipótese que não resiste a um exame minucioso. 
     Logo, a Igreja Católica, nesse caso, não caiu em contradição. Cada um desses dois personagens abordados executa papéis distintos, em contextos diferentes, além de possuírem visões de mundo diametralmente opostas. O suicida caminha vacilante, incerto do seu destino e torcendo pelo fim definitivo; o mártir transborda serenidade, mesmo entrevendo a destruição do seu corpo físico, elemento de uma vida secundária na concepção dele. A morte de um mártir poderia constituir uma profunda lição de vida para um suicida. Demonstra como a fé enraizada pode dar força ao indivíduo para que ele não ceda às pressões externas em situações extremas. 

Mg

VOCABULÁRIO 

Mártir 

substantivo de dois gêneros 

1 pessoa submetida a suplícios, ou mesmo à morte, pela recusa de renunciar à fé cristã ou a qualquer de seus princípios 

2 Derivação: por extensão de sentido. 

pessoa que sofreu torturas, ou mesmo morte, por não renunciar a qualquer outra crença, religiosa ou política 

3 Uso: hiperbólico. 

pessoa que sacrifica a própria vida ou algo de muito valor para levar a cabo algum trabalho ou experiência 

Ex.: m. da ciência 

4 Uso: hiperbólico. 

pessoa que sofre intensa e constantemente de um determinado mal 

Ex.: m. do câncer 

5 Derivação: por extensão de sentido. Uso: jocoso. 

vítima da tirania de certas convenções 

Ex.: m. da moda 



Martírio 

substantivo masculino 

1 tormentos e/ou morte infligidos a alguém em consequência de sua adesão a uma causa, a uma fé religiosa, esp. à fé cristã 

Ex.: o m. de são Sebastião 

2 Uso: hiperbólico. 

grande sofrimento, grande aflição 

Ex.: um amor não correspondido é um m. 





Suicida 

adjetivo de dois gêneros 

1 relativo a ou que envolve suicídio 

Exs.: revolução s. 

luta s. 

2 que serviu de instrumento de suicídio 

Ex.: revólver s. 

3 em que há dano ou ruína certa para o agente 

Ex.: atitude s. 



 adjetivo de dois gêneros e substantivo de dois gêneros 

4 que ou aquele que comete suicídio 



Suicídio 

substantivo masculino 

Regionalismo: Brasil. 

1 ato ou efeito de suicidar-se 

Ex.: cometer s. 

2 Derivação: sentido figurado. 

desgraça ou ruína causada por ação do próprio indivíduo, ou por falta de discernimento, de previdência etc. 

Ex.: sua ida para outro partido foi um s. político 

3 Rubrica: ludologia. Regionalismo: Brasil. 

em sinuca e jogos afins, ato de o jogador encaçapar involuntariamente a bola branca

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