quinta-feira, 23 de abril de 2015

Sessão Nostalgia Desmemorada 3



25 de agosto de 2011

Trans-Sinfonia

      O intinerário era Vale dos Rios-Barra, com todos os vai e vem e volta e não vai... e não vai... e não vai... e vai indo... mais um pouquinho...ao rítmo invisível de Martinho da Vila, rítmo esse amplamente adotado, desenvolvido e divulgado no seio do trânsito soteropolitano. A melodia martiniana se intensifica, ganhando tons agudos ou graves a depender da configuração das nuvens que parecem aderir e exaltar o movimento geral da cidade. 
     Na verdade, esses aglomerados cinzentos de potenciais catastróficos imprimem seu próprio movimento ou não-movimento às óticas enclausuradas, nos seus carros. Não o movimento veloz, quando descem de seus tronos celestiais, mas aqueles goticulares vítreos ( as gotinhas se condensando no vidro, morosas, despreocupadas). 
     Eu observava tudo isso do famoso R3 rumo ao campus florestal ondinense. Talvez a preservação da mata auxilie as ciências biológicas... De qualquer modo, aquelas gotas se acumulavam tediosas na janela, quando um som peculiar me desvia a atenção... sanfona? Sim, era uma sanfona com direito a batucada de tambor! Por um instante acreditei que o São João havia retornado, apesar das feições pouco simpáticas de alguns ouvintes, atípicas no São João. O som era até agradável, o cantor nem tanto, mas sua voz se arrastava junto ao espalhar das águas nas janelas. Tudo ia mais ou menos bem até os vizinhos nos seus autoimóveis resolverem contribuir com o som mais alto ao seu alcance... 
     As buzinadas irrompem na atmosfera chuvosa e invadem dissonantes a harmonia junina que tentava se estabelecer no sistema auditivo. Não sei bem se existe conflito entre os sons ou se eu imaginei tudo isso, graças à dificuldade do cérebro em decodificar tantas "harmonias" distintas... Harmonias no Plural maiúsculo, porque não podemos esquecer do burburinho comunicativo e das pessoas na rua, tentando ganhar a vida precariamente. Nesse momento, entro numa crise existencial, pois tento abstrair tudo quanto seja possível, me aproximando de um estado meditativo-anestésico. Mas... como só Jesus salva, a meditação durou pouco.      
     A palavra de Deus me despertou com seu discurso arrebatador, pra não dizer sacudidor das entranhas do ser com foco especial no já castigado ouvido. Não sei se Jesus enunciou "gritai e orai"... (talvez seja um texto suprimido dos evangelhos ou, quem sabe, o nascimento de uma heresia que eu poderia batizar de enfaticismo, afinal os acadêmicos necessitam desses conceitos bem elaborados para seu próprio bem). Seja como for, meus ouvidos atingiram o nirvana devido à ressonância ininterrupta e insistente da palavra divina. O ônibus passava pelo transbordo que estava sendo batizado pelo ar ( pela água já está ultrapassado). A banda junina desce do seu palco móvel ( coisas da modernidade de recriar contextos e resignificar espaços) e, quando penso em me concentrar na melodia da chuva, eis que o pessoal é convocado para exercer seu papel de consumidores no capitalismo emergente das classes C, D e Etc.


     Boa noite, pessoal! Desculpe incomodar o silêncio da viagem que vocês devem estar fazendo com esse texto, mas, pessoal, chegaram aqui as deliciosas palavras mgenianas, esse texto que “cês” acabaram de ler. Agora, eu vou recolher e aqueles que tiverem interesse, aqui na minha mão, é apenas 1R$, na promoção! Perpétua promoção, diversão é o passatempo da viagem, pessoal!

O trânsito pode ser lento, mas a cidade continua agitada e meus pensamentos seguem essa Trans-Sinfonia.

Mg

Até o próximo post!

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