quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Preconceito, preconceito meu, existe alguém mais preconceituoso do que... eu¿




     Falar de preconceito virou moda. Falar, na verdade, contra o preconceito, bradar o mais alto possível, a fim de eliminá-lo de uma vez da face sofrida da Terra! Todos se acautelam de se dizerem preconceituosos: preconceituoso eu¿ Jamais! Existe o policiamento vocabular, o império do politicamente correto, a polidez, o verniz da civilização! Aquele brilho cínico estampado em sorrisos educados; aquela atmosfera morna que percorre os salões das mais requintadas festas, das conferências, dos congressos. Preconceituoso você¿ A não ser que encarne o Deus onisciente...Sim, sim, sim!
     Segundo o dicionário Houaiss, preconceito é: “1 qualquer opinião ou sentimento concebido sem exame crítico 1.1 ideia, opinião ou  sentimento desfavorável formado sem conhecimento abalizado, ponderação ou razão 2 sentimento hostil, assumido em consequência da generalização apressada de uma experiência pessoal ou imposta pelo meio; intolerância (...)”.
      Ora, a ignorância é a essência própria do preconceito, é sua razão de ser tal como é. Fala-se muito em tipos específicos de preconceito: contra negros, mulheres, pobres, LGBTS e religiosos. Porém, esquecem a diversidade de preconceitos que abarcam ou podem abarcar tudo e todos, cada grão daquilo chamado realidade. Desse modo, ouso complementar o Houaiss, sinalizando que nem todo preconceito encarna uma negativação, contudo seu cerne encontra-se na invariável distorção apresentada por ele.
      Cada vez que nos deparamos com um novo objeto, um novo evento, um novo dado da realidade, nos apressamos em decodificá-lo da melhor maneira possível, utilizando nossos referenciais do passado e todo arcabouço que seja viável empregar num curto espaço de tempo. A eficiência desse processo pode ser vital em certas situações e irrelevante, a curto prazo, em muitas outras. E a partir daí podemos rastrear o verdadeiro problema. O preconceito sempre foi e será inerente à vida humana, assim como as limitações do conhecimento são cada vez mais colossais, à medida que esse conhecimento avança. Por isso, a problemática não está nas apressadas ideias pré-concebidas que fazemos do real e, sim, no enraizamento dessas conclusões necessariamente distorcidas e superficiais.
      Muitas vezes confunde-se o preconceito com o ato discriminatório, este, sim, intolerável e passível de erradicação. A discriminação, enquanto ação, não poderá materializar-se, caso seja precedida de um mínimo de reflexão. A tal ponderação e razão apontadas pelo Houaiss. Lembrar aquela estória de dois ouvidos e uma boca; contar até dez, até mil; respirar fundo e exercer essa fascinante habilidade denominada: pensar.

        Se formos penetrar mais fundo na dicotomia conhecimento\ignorância, será forçoso reconhecer a inexorabilidade da distorção, enquanto uma condição humana de enxergar a realidade. No entanto, ainda que as trevas estejam presentes a cada ponto de luz acendido, não podemos olvidar os efeitos dessa iluminação na nossa capacidade de ver melhor o mundo, de transitar nele e estruturá-lo mais satisfatoriamente. Nesse sentido, o foco do nosso combate deveria ser o comodismo, a passividade, a inflexibilidade diante do mundo, diante do novo. Reacendamos o dinamismo próprio do ser humano. Dínamo que é força, que é alma, que é vida! A curiosidade, a sede insaciável pelo conhecimento. Assim, estaremos sempre nos deslocando para longe dessa superfície preconceituosa, mas talvez nunca cheguemos ao fundo da “toca do coelho”.

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